quinta-feira, 25 de novembro de 2010

CITCEM Família, Espaço e Património [ACTUALIZAÇÃO 13/12/2010]

Tenho andado bastante afastado e com pouco tempo para reflectir sobres estes tempos extraordinários que vivemos (apetecia-me antes dizer "Tempos Modernos", parafraseando Chaplin, mas "extraordinários" também serve!). Mas gostava de dar outras pistas sobre o 1.º Encontro CITCEM, "Família Espaço e Património", em que tive a oportunidade de participar, com uma modesta contribuição que pode ser lida aqui.

Chamo a atenção para a comunicação do Prof. Doutor Gaspar Martins Pereira, que actualizou/prosseguiu os seus estudos sobre as "ilhas" do Porto [relembro que a sua investigação pioneira sobre o tema surgiu na sua tese de doutoramento, em 1993, posteriormente publicada sob o título "Famílias Portuenses na Viragem do Século (1880-1910)", em 1995, pelas Edições Afrontamento, continuada depois no artigo "Housing, Household and Family. The 'Ilhas' of Porto at the end of the 19th Century", Journal of Family History, Vol. XIX (3), 1994]; mas também as comunicações de Nelson Mota, sobre "O espaço doméstico burguês do Porto no final do século XIX", e de Paulo Castro Seixas, "Ilhas e Novos Condomínios no Porto do Século XX". [Lamento apenas que a comunicação do Prof. Virgílio Borges Pereira, que está a coordenar o estudo sociológico sobre habitação social e classes laboriosas portuenses, não esteja disponível on-line.]

O programa completo do 1.º Encontro CITCEM, "Família, Espaço e Património", com diversas, interessantes e relevantes comunicações pode ser encontrado aqui. Quanto aos links que estão aí em baixo, não faça caso, não são importantes.

Descarregue o programa completo e o cartaz

Tudo o que você sempre quis saber sobre a greve... mas nunca teve coragem de perguntar! (ou não lhe souberam explicar) Epílogo

Contar espingardas

A importância do trabalho nas sociedades contemporâneas é primordial. Não nos podemos admirar com o que se pode dizer e se vai dizendo sobre o dia-depois-da-greve-geral-de-24-de-Novembro. Muitos trabalhadores dirão e agora? O que muda? Muita coisa, diria.

O que se nota, em primeiro lugar, é o MEDO dos trabalhadores. Muitos, perfeitamente solidários com a luta das centrais sindicais, foram trabalhar com medo das represálias dos patrões. E é verdade, já chegaram os ecos dessas retaliações, tomadas logo no próprio dia da greve. Outros, também solidários com a luta, meteram um dia de férias, não perderam a remuneração. Outros, ainda, foram trabalhar contra a vontade, sem fazerem greve, pois não se podem dar ao luxo de travar uma batalha desigual com os patrões, estando completamente dependentes das relações precárias que lhes asseguram a sobrevivência.

[Há quem diga que a greve geral de 24 de Novembro foi uma greve da classe média, dos trabalhadores do Estado, daqueles que têm salários mais elevados, mas que vão ser mais diminuídos em 2011. É possível, é que os outros, os que têm salários mais baixos têm relações de trabalho precárias, ao contrário destes.]

É verdade, é um combate desigual. Por mais leis que protejam as relações laborais (e que os países ricos da Europa ainda exigem que Portugal as altere em favor do patronato), a parte mais forte está sempre do lado do patronato. As leis do trabalho existem precisamente para tentar equilibrar uma relação onde existe sempre uma parte mais forte e outra mais fraca.

Isto não quer dizer que esta relação tenha que ser sempre uma luta de classes. Há patrões, muitos e o que se espera é que sejam mais, inteligentes, atentos, que entendem que as suas empresas são competitivas por causa da força de trabalho que empregam. Mas não são a maioria. Como se sabe, aliás, os patrões portugueses são dos mais iletrados da Europa, têm menos habilitações que os seus trabalhadores, e apenas entendem essas relações como uma relação de exploração que lhes permite acumular riqueza pessoal. [Não acredita? Então leia isto ou isto.]

Mas a importância das empresas reside precisamente aí, na criação de riqueza, que deve ser produzida em beneficio da empresa, dos empregados, do patrão, da comunidade em que se insere, na sociedade em geral, no tecido produtivo de um país.

Tudo isto se tem alterado com os actuais governantes da Europa que apenas têm privilegiado a acumulação da riqueza por parte do capital especulativo. Isso é visível na forma como os governos acorreram em massa a salvar os bancos falidos, com dinheiro dos contribuintes. E depois disso, que provocou o descontrolo das contas públicas, ainda vão exigir aos contribuintes que continuem a pagar as operações de socorro ao capital especulativo, à custa dos cortes salariais, aumento de impostos e imposição da “precarização” do trabalho.

Não é necessário recorrer aos exemplos da Irlanda ou da Grécia para perceber isto, temos suficientes exemplos domésticos. O poder político em Portugal que, desde 1974, se resume a três partidos (que podemos considerar de direita), habituou-se a gastar demais; pela acção demonstrada na administração das contas públicas em três décadas, os governos, que gerem as contas públicas, demonstraram ser, no mínimo, maus gestores (também é verdade que herdaram todos os vícios de mais de 40 anos de um regime autoritário, mas isso são outras histórias). Nas últimas décadas aliaram-se ao poder do capital especulativo, protegendo-o a todo o custo, através da baixa taxação, incentivando obras públicas financiadas por esse capital e, agora, como se viu nestes últimos anos, nacionalizando as dívidas dos bancos, injectando dinheiro público em instituições sem qualquer hipótese de recuperação. E agora exigem, claro, que sejam os trabalhadores (a parte mais fraca, lembram-se?) a pagar os desvarios dos seus agentes. Em termos inteligíveis, nada disto faz sentido, a não ser que se tenha institucionalizado o roubo!

 Ainda podem argumentar, Ah mas são os mercados internacionais que estão a fazer chantagem com os países mais fracos… Pois, o fascismo financeiro ou social (leiam bem este conceito proposto por Boaventura Sousa Santos aqui ou ainda aqui)! Isso é uma desculpa de mau pagador. Fiquei muito surpreendido com a argumentação do presidente do Conselho Económico e Social, Silva Peneda, no tal programa televisivo de serviço público que falei aqui. O que ele diz é que há soluções e que elas só não avançam porque a nossa União Europeia está lotada de maus políticos, gente que anda aí a mando do poder especulativo financeiro que, pelo que se vê, tomou conta da Europa.

Pergunte-se então, e agora, o dia depois da greve? Pois bem, medimos forças e preparemo-nos para a próxima, porque só assim nós, que somos a parte mais fraca das relações de trabalho, teremos hipótese de voltar a reequilibrar esta disputa e construirmos uma sociedade mais justa.

É pouco? Não, é muito! Se nada fizéssemos, continuaríamos a perder mais um pouco de nós.

Outras reacções:

Outro registo:
Le Monde via Clube de Jornalistas: http://www.clubedejornalistas.pt/?p=3559

Testemunhos:
Como intimidar trabalhadores precários (com vídeo): 
Forças policiais contra grevistas (com vídeo): 

Recomeça a ofensiva:

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Tudo o que você sempre quis saber sobre a greve… mas nunca teve coragem de perguntar! (ou não lhe souberam explicar) II

As greves são uma consequência das sociedades contemporâneas, que é o mesmo que dizer que são uma consequência da Revolução Industrial [não vou explicar este conceito agora, mas pode perceber melhor a afirmação aqui, aqui e aqui].

As greves surgem como um sucedâneo do capitalismo fabril. A invenção e evolução da máquina a vapor permitiu mecanizar determinadas indústrias e baixar os preços no consumidor; permitiu o desenvolvimento de indústrias a jusante (o caso da extracção de carvão), oferecendo trabalho certo, mas com baixas remunerações e muitas horas no emprego (muitas não pagas).

[à esq. foto não creditada in Cordeiro, José Manuel Lopes (2010), História do Porto, Desafio à República, Cidade Inconformada e Rebelde, Lisboa: QuidNovi; Distribuição com o Jornal de Notícias; à dir. imagem da Companhia Fabril do Norte, não assinada, Associação Empresarial de Portugal, in Carvalho, Manuel Jorge Pereira (2010), História do Porto, Prenúncios de Mudança, do 31 de Janeiro ao Regicício, Lisboa: QuidNovi, Distribuição com o Jornal de Notícias.]


O incremento da indústria em Portugal, também responsável por melhores vias de comunicação, provocou uma migração do campo para a cidade; em Portugal, no século XIX, o número de pessoas que acorrem às cidades é muito elevado. Os trabalhadores rurais, pobres, analfabetos, fogem do duro trabalho no campo, em busca de uma vida melhor; no campo, a terra que trabalham não lhes pertence e ainda têm que pagar o seu uso. Mas as cidades não têm capacidade para alojar estes milhares de trabalhadores, que se vão instalando onde podem; no Porto, nas “ilhas”, nos “prédios esguios” do centro histórico; em Lisboa, nas vilas e pátios, depois nos bairros de lata. Trabalham de sol a sol, sem condições, a troco de salários muito baixos, que não lhes permite mais do que pagar a “renda da casa” e alguma comida. Vivem em aglomerados insalubres, onde a mortalidade (tal como a natalidade) é muito elevada.

As primeiras leis do trabalho em Portugal surgem ainda no século XIX, no período da monarquia constitucional; mas a dificuldade em cumpri-las é notória, originando um rasto de agitação que culmina na implantação da República, em 5 de Outubro de 1910. Entre 1852 e 1910 registam-se mais de 550 greves.
[Desfile do 1.º de Maio, Portugal Pittoresco e Ilustrado, I, 1903 in Roque, João; Torgal, Luís Reis (Coord.) (1993), O Liberalismo, in Mattoso, José (Dir.), História de Portugal, Lisboa: Editorial Estampa.]

Quando se decidia uma greve, parava tudo! Não havia pré-avisos, nem piquetes, nem fura-greves. Parava tudo e só se retomava o trabalho quando as reivindicações fossem cumpridas. Os patrões, em reacção, promoviam os “lock outs”, ou seja, encerravam a fábrica antes de os trabalhadores decidirem a greve e ocuparem as instalações. A diferença era que os patrões tinham as forças da autoridade do seu lado, que muitas vezes corriam os grevistas à bastonada.
[Operária conserveira encaixotando latas de conserva numa fábrica do sul do País, anos 1940, foto não assinada, Indústria Portuguesa, Out. 1946, in Rosas, Fernando (Coord.) (1994), O Estado Novo, in Mattoso, José (Dir.), História de Portugal, Lisboa: Editorial Estampa.]

Em data que não consigo precisar, mas já no Estado Novo, quando a greve era proibida [como muitos neoliberais ainda hoje defendem; o melhor era chamar-lhes fascistas], as trabalhadoras conserveiras de Matosinhos realizaram longas jornadas reivindicativas, paralisando as fábricas, mesmo que fossem violentamente reprimidas. Uma greve de mulheres era praticamente inédita no início do século XX, para mais na indústria conserveira, em que só os soldadores (de latas de conserva) estavam habituados a greves. Que reclamavam estas mulheres? Luvas! Apenas luvas! É que eram elas que tinham que preparar o peixe que vinha do mar mergulhado em gelo; ao fim de umas horas já não sentiam as mãos. Os patrões, primeiro reprimiram, depois acabaram por ceder! Parece um absurdo! [Lamento não nomear a fonte, mas assim que a tiver, indico]

[GNR dispersa concentração de operárias grevistas no Barreiro, 1943, foto não assinada, retirada de senseikaratemaster.blogspot.com, mas também disponível em O Estado Novo, ver legenda anterior.]

O Estado Novo proibiu as greves, mas nem assim os trabalhadores deixaram de as fazer e isto ao longo de mais de 40 anos. Foram sempre greves muito duras, reprimidas violentamente pela polícia e guarda republicana. E mesmo assim, os trabalhadores portugueses, os nossos avós e bisavós, não deixaram de as fazer.

Hoje, os “jornalistas” do regime já sentenciaram que os trabalhadores portugueses não devem fazer greve. A vice-directora de informação do serviço público de televisão, numa entrevista a Jerónimo de Sousa na semana passada insistiu diversas vezes com o entrevistado: “para que é que serve esta greve geral?” recusando ouvir explicações. Se acha que exagero, compare esta entrevista com esta; a incomodidade e enfado comparados com a condescendência e simpatia.

O debate de ontem na RTP1, num programa que costuma servir para defender o estado das coisas, foi anunciado, na semana passada, como uma discussão sob o tema “Vale a pena fazer greve?”. Alguém se deve ter apercebido da parvoíce do tema e cessou a divulgação, acabando o programa por ser realizado com o título “Greve Geral – Os ganhos e a perda”, um título que não compromete, mas também não diz nada. Não aprecio o programa, mas acompanhei-o e recomendo-o.

Se as gerações actuais não aderirem à greve… Que terão a dizer dos seus avós e bisavós, que faziam greve quando ela era proibida? O que terão a ensinar aos seus filhos?

O meu comentador “preferido” na televisão, o único que sigo, no seu jeito paternalista e defensor do status quo (a simplicidade com que fala nos mercados…) e do principal partido da oposição (que um dia será governo – a evolução da continuidade!) disse a mesma coisa que os “esclarecidos” jornalistas do serviço público! Acha que a greve vai ser muito participada, mas também que não vale de nada porque temos que seguir esta política (em favor do capital e do sector financeiro, contra os trabalhadores, assalariados, pequenos empresários e comerciantes, agricultores). Mas o comentador dominical também não deve nada  aos seus antepassados, afinal, o seu pai foi ministro e governador de Salazar.

Portanto, quarta-feira dia 24 de Novembro de 2010:
Adira à greve – contra a “política dos mercados”, contra os ataques aos trabalhadores, às pequenas e médias empresas, ao sector produtivo português; contra as políticas impostas por Bruxelas em favor da Alemanha e da França, contra o abaixamento dos salários, contra a “precarização” do emprego, contra os partidos do poder que não sabem governar Portugal.
Adira à greve – pela defesa de uma sociedade melhor, mais justa e equilibrada, por uma política europeia e mundial que coloque o trabalho e os valores sociais no centro da discussão política.

Por isso, não vá às compras, não vá passear para o shopping e hipermercado; solidarize-se com os trabalhadores, com os pensionistas e com a juventude que vai herdar esta sociedade e este estado de coisas.

Se quiser ainda mais razões para aderir à greve, pode encontrá-las aqui.

domingo, 21 de novembro de 2010

Tudo o que você sempre quis saber sobre a greve... mas nunca teve coragem de perguntar! (ou não lhe souberam explicar) I


NORMAS A OBSERVAR NA GREVE GERAL

O direito à greve é garantido no artigo 57.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). Vincula todas as entidades públicas e privadas (art.º 18.º, n.º 1 da CRP), não pode ser restringido, salvo se em colisão com outros direitos fundamentais (ex.: o direito à vida, o direito à saúde, o direito à segurança) e apenas na medida necessária a garantir as condições mínimas de exercício desses outros direitos e sempre com salvaguarda do seu núcleo essencial (art.º 18º, n.º 2 da CRP) e confere aos seus titulares o direito de resistir a qualquer ordem que o ofenda (art.º 21º da CRP).

Estão abrangidos pelo pré-aviso de Greve Geral todos os trabalhadores, independentemente da natureza do vínculo profissional, desde que sejam trabalhadores por conta de outrem, prestem serviço no território nacional, em empresas e serviços públicos ou privados, seja qual for a natureza jurídica da entidade empregadora, independentemente de serem ou não sindicalizados.

Nos termos do art. 535.º do Código do Trabalho as entidades patronais não podem, durante a greve, substituir os grevistas por pessoas que, à data do seu anúncio, não trabalhavam no respectivo estabelecimento ou serviço, nem podem, desde aquela data, admitir novos. Segundo a Jurisprudência n.º 2/2001, do Supremo Tribunal de Justiça, por estabelecimento ou serviço deve entender-se “ o local onde de acordo com a distribuição do serviço organizada pela entidade patronal, estava prevista a apresentação do trabalhador para trabalhar durante a greve ”.

Nenhum trabalhador é obrigado a comunicar antecipadamente à entidade patronal a sua intenção de aderir ou não a uma greve. Exorbita, assim, do poder de autoridade e direcção da entidade patronal a exigência de que os trabalhadores manifestem, com antecedência, a vontade de aderir à greve (entendimento adoptado no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 9 de Novembro de 1983, no processo 20/83).

A greve suspende, no que respeita aos trabalhadores que a ela aderirem, as relações emergentes do contrato de trabalho, nomeadamente o direito à retribuição e, em consequência, desvincula-os dos deveres de subordinação e de assiduidade. O período de suspensão não prejudica a antiguidade e os efeitos dele decorrentes, nomeadamente no que respeita à contagem do tempo de serviço. E a ausência por motivo de greve não afecta a concessão de subsídios de assiduidade a que o trabalhador tenha direito (Acórdão da Relação de Lisboa, Processo 3173/2006-4).

JUNTA-TE A NÓS! PARTICIPA NA GREVE GERAL DE 24 DE NOVEMBRO!

Perguntas & Respostas

Quem tem direito a fazer greve?
O direito à greve, consagrado na Constituição, é um direito de todos os trabalhadores, independentemente da natureza do vínculo laboral que detenham, do sector de actividade e de serem ou não sindicalizados.

Pode um trabalhador, sindicalizado ou não, aderir à greve declarada por um outro sindicato?
Pode, desde que a greve declarada abranja a empresa ou sector de actividade bem como o âmbito geográfico da empresa onde o trabalhador presta a sua actividade.

Deve o trabalhador avisar antecipadamente o empregador da intenção de aderir à greve? 
Não. O trabalhador, sindicalizado ou não, não tem qualquer obrigação de informar o empregador.

No dia da greve o trabalhador deve apresentar-se no seu posto de trabalho?
Não. A greve suspende, no que respeita aos trabalhadores que a ela aderirem, as relações emergentes do contrato de trabalho, nomeadamente o dever de assiduidade.

E depois de ter aderido à greve, tem que justificar a ausência?
Os trabalhadores não têm que proceder a qualquer justificação da ausência, devendo simplesmente comunicar posteriormente que participaram na greve para que não lhes seja assinalada falta injustificada.

O dia da greve é pago?
Não. No que respeita aos trabalhadores que a ela aderirem, a greve suspende as relações emergentes do contrato de trabalho, nomeadamente o direito à retribuição. Mas também não prejudica a antiguidade do trabalhador ou a contagem do tempo de serviço.

Quem pode constituir e integrar piquetes de greve?
Os piquetes de greve são organizados pelos sindicatos e constituídos por um número de membros a indicar por aqueles. Podem ser integrados por trabalhadores da empresa e representantes dos sindicatos.

Que competências têm os piquetes de greve?
Os piquetes de greve desenvolvem actividades tendentes a persuadir os trabalhadores a aderir à greve, por meios pacíficos e sem prejuízo do reconhecimento da liberdade de trabalho dos não aderentes à greve.

O empregador pode por qualquer modo coagir o trabalhador a não aderir a uma greve ou prejudicá-lo ou discriminá-lo pelo facto de a ela ter aderido?
Não. É absolutamente proibido coagir, prejudicar e discriminar o trabalhador que adira a uma greve.

JUNTA-TE A NÓS! PARTICIPA NA GREVE GERAL DE 24 DE NOVEMBRO!

[Se tiver dúvidas, pergunte]

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Welcome to the new World


by banksy

Ace in the Hole

Quando os mineiros chilenos foram descobertos, vivos, a cerca de 700 metros de profundidade, há cerca de dois meses, lembrei-me imediatamente do filme de Billy Wilder, Ace in the Hole (1951). [Segundo a wikipedia, o título para Portugal é "O Grande Carnaval"; para o Brasil é "A Montanha dos Sete Abutres"]

O filme de Wilder é uma sátira ao jornalismo sensacionalista, que continua perfeitamente actual, meio século depois de ter sido lançado. Um jornalista caído em desgraça, interpretado por Kirk Douglas, depois de uma carreira de sucesso nas grandes cidades americanas, procura uma “caxa”, um grande furo, para voltar à ribalta, para voltar a ser notado pelos jornais de expansão nacional.

Descobre então um “caçador de tesouros” preso numa gruta, vítima de uma derrocada. Em vez de o libertar de imediato, vai prolongando o seu salvamento, atraindo sobre si, o único interlocutor da vítima, as atenções de todo o país, que vibra sobre a iminência da morte do homem preso. Quando finalmente percebe que é tarde demais, que já não é possível salvar o homem, tenta redimir-se, mas nesta altura todos os que fizeram o circo em volta da iminência da morte já abandonaram o local, desprezando todo o espectáculo entretanto criado.

O paralelismo com os mineiros chilenos é irresistível. Mais de 30 homens presos no subsolo, a 700 metros de profundidade; à superfície, dezenas de repórteres de televisão de todo o mundo, acompanhando em directo uma inédita tentativa de salvamento; familiares e companheiros em desespero; e o presidente da república do país, que em última instância é o responsável pela segurança do mineiros, como garante do cumprimento das regras de segurança da indústria extractiva no Chile.

Desta vez, a realidade está a ultrapassar a ficção; nesta altura já saíram da mina 17 mineiros; faltam ainda alguns, mas tudo corre como planeado.

Esperemos que saia daqui também alguma lição para a indústria extractiva a nível mundial (isto depois do derrame de petróleo da plataforma da BP no Golfo do México; do derrame de lamas de alumínio na Hungria) e para a indústria da informação (que sofre uma crescente tendência para se transfigurar em indústria do efémero e do entretenimento, quando dela se espera um papel relevante na formação de opinião pública das sociedades democráticas).

[imagens retiradas de www.jeffpidgeon.com/ e oglobo.globo.com]

terça-feira, 5 de outubro de 2010

República, Estado Novo e Democracia

A República Portuguesa faz hoje 100 anos, foi implantada há 100 anos. É frequente ouvir-se falar, mesmo por historiadores, que estamos a festejar a implantação da 1.ª (I) República, contando que ouve uma 2.ª (II) República e que nos encontramos na 3.ª (III) República.


Pode ser confortável arrumar o nosso século XX desta forma, mas não é a mais correcta.


A República Portuguesa foi implantada no dia 5 de Outubro de 1910; procede o regicídio (1908) e um período de monarquia constitucional (1820-1910), regido por oito soberanos e que manteve liberdade e crescimento de imprensa, mostrando-se incapaz ou relutante em alterar a estrutura da sociedade proveniente da Idade Média, claramente estratificada em nobreza, clero e povo, mas agora com novas classes actuantes a surgir. [Correcção: a prática da liberdade de imprensa, entre 1820 e 1890, é relativa, houve períodos de maior ou menor liberdade. Os anos anteriores ao regicídio foram de grande repressão; os ardinas, por exemplo, só podiam pregar o título e o preço  do  jornal, chegando a haver palavras proibidas. Sobre a relutância ou incapacidade em alterar a estrutura da sociedade, ela foi sendo mudada e moldada pela ascensão da burguesia, pelo capitalismo e pelo advento do operariado. Foi um período muito rico e agitado da nossa história, que não é fácil traduzir em poucas linhas, permanecendo ainda hoje um terreno fértil para o debate e para o conhecimento.]


A República durou 16 anos, até ao golpe militar de 1926. Em 1933 é promulgada uma nova Constituição, que dá início ao Estado Novo, um regime autoritário, de tendência totalitária, até 1945, e que durou até 1974, altura em que surge um novo golpe militar, instaurando a Democracia, o regime em que nos encontramos, já depois da adesão do país a uma comunidade interestadual, a que hoje chamamos União Europeia, em 1985.


Comodamente, muitos chamam 1.ª (I) República aos 16 anos que precedem o golpe militar de 1926; 2.ª (II) República ao Estado Novo; e 3.ª (III) República ao regime democrático. O mais correcto seria designar-se estes três estádios por República, Estado Novo e Democracia.


O Estado Novo não foi um regime republicano; foi um regime fascista, de partido único, como os regimes totalitários europeus até ao fim da II Guerra Mundial, que exercia um forte controlo sobre as liberdades públicas e privadas, sem liberdade de imprensa, sem liberdade de associação, em que a capacidade eleitoral só era concedida a quem se comprometesse com o regime. O Estado Novo não foi uma república, apesar do texto constitucional a promover como tal. Conforme a lei fundamental, quem deveria ter o poder político era o Presidente da Republica, mas quem na verdade o detinha era o presidente do conselho que, inclusivamente, escolhia quem deveria ser o presidente. Marcelo Rebelo de Sousa diz que a Constituição de 1933 era uma constituição semântica, “intencionalmente construída para legitimar uma prática bem determinada”.


A questão coloca-se, portanto, na identificação de Portugal como um Estado republicano, desde 1910 até hoje. E o que fazer aos 48 anos de fascismo, se preferirem, aos 48 anos de autoritarismo? Não houve certamente republicanismo nesse período. A solução é prática, tal como se adoptou aquela numeração para a nossa evolução política nos últimos 100 anos: República, Estado Novo e Democracia.


Festejamos hoje a implantação da República; no dia 25 de Abril de 2011 havemos de festejar a implantação da Democracia, que marca o fim do Estado Novo, sobre o qual não teremos nenhum pretexto para assinalar a implantação. Devemos, sim, estudar esse período das trevas para percebermos como éramos e no que nos tornámos.


Fontes e bibliografia:

LOFF, Manuel (1996) – Salazarismo e Franquismo na Época de Hitler (1936-1942). Porto: Campo das Letras.


Imagens retiradas respectivamente de:

www.parlamento.pt

bordalopinheiro.wordpress.com

historiaeciencia.weblog.com.pt

2muchignoranceisbad.wordpress.com

segunda-feira, 5 de julho de 2010

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Sim, um presidente insustentável!

Um presidente insustentável?


Objetivamente, o presidente de Portugal recomenda às agências de avaliação de risco que obriguem os portugueses a confiarem no mercado financeiro e a confiarem tanto mais quanto menos o mercado confiar neles.

Boaventura de Sousa Santos

As declarações do Presidente de Portugal sobre a situação do país, que declarou insustentável, são difíceis de aceitar e causariam repulsa pública se os portugueses ainda dessem muita atenção aos dirigentes políticos e se os meios de comunicação não estivessem dominados por comentadores conservadores. O ritmo pausado contribui para conferir solenidade e finalidade à verdade do discurso, fazendo-a passar por discurso da verdade, uma verdade parida pela sabedoria oracular e registada na página da internet da presidência da República.

Os portugueses sabem por experiência que vivem momentos difíceis e que essas dificuldades são o resultado de uma acumulação de fatores nacionais, europeus e globais. No que respeita aos fatores nacionais, a acumulação vem de longe. Tudo começou quando os fundos estruturais e de coesão, depois de contribuírem para a necessária infra-estruturação física do país, ficaram reféns dos lóbis do betão (concreto) e se descurou o investimento na educação, na formação, na criação de um sistema nacional de ciência, na diminuição das desigualdades sociais de modo a que os ganhos de produtividade se transformassem em bem-estar dos portugueses.

Ora, os governos de Cavaco Silva contribuíram para este desvio fatídico. A formação profissional foi entregue à corrupção generalizada; iniciou-se o desinvestimento nas universidades públicas, sujeitando-as à pilhagem dos seus recursos para alimentar os aviários universitários que então proliferaram; em termos de desigualdade social, o país era mais injusto em 1995 que em 1990 (e mais que em 1980). O que é hoje “insustentável” começou a sê-lo há muito, e nesse processo Cavaco Silva foi mais parte do problema do que da solução.

Quanto aos fatores europeus, os portugueses sabem que a Europa está num momento de bifurcação: ou se desagrega ou se transforma numa Europa federal ou confederada, com partilha democrática de custos e benefícios, de políticas e aspirações. A segunda opção é a única desejável e só se realiza quando os cidadãos europeus a assumirem como sua e disserem “Basta!” à transformação da crise real em pretexto mal disfarçado para destruir todos os direitos sociais por que lutaram, com tanto sangue vertido, ao longo de todo o século XX. Quanto aos fatores globais, os portugueses começam a saber que a União Europeia se deixou minar pelo capitalismo financeiro global. O FMI é uma instituição nefasta que os EUA não deixaram intervir no país durante a crise mas que a UE acolhe como um imenso cavalo de Tróia em cujo bojo se escondem os bancos alemães e franceses à espera que lhes sejam pagos empréstimos feitos a juros confiscatórios.

Com objetivos convergentes, foi permitido às agências de análise de risco converter os orçamentos nacionais em campos de apostas para o cassino financeiro. Tais agências são peritas em utilizar as afirmações irresponsáveis dos responsáveis políticos “locais” para transformar em realidade as especulações em que assentam as suas previsões.

Objetivamente, o presidente da República recomenda às agências que obriguem os portugueses a confiarem no mercado financeiro e a confiarem tanto mais quanto menos o mercado confiar neles. Isto, sim, é insustentável!

Por que razão tudo isto, sendo claro, escapa ao presidente da República? Porque está em campanha eleitoral, tendo deixado de fazer política de Estado para passar a fazer política partidária, e querendo testar a sensibilidade da mídia para o apoiarem e ao seu relutante partido. Os resultados mostram que tem razões para se sentir confiante. Tragicamente, a sua confiança é construída à custa da destruição imprudente e injusta da confiança dos portugueses no país e no mundo em que vivem, o que é particularmente grave num período de crise. Mas a cegueira eleitoral é assim mesmo, tanto mais seletiva quando menos o devia ser.

Ao presidente da República escapa que os portugueses podem começar a pensar que ele quer acima de tudo ser reeleito, pouco lhe importando se é reeleito presidente de um país ou presidente de uma ruína de país.

Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).

(via agência carta maior)
(imagens retiradas de catedral.weblog.com.pt)

domingo, 20 de junho de 2010

A derradeira homenagem

[imagem retirada do expresso on-line]
Enquanto escrevo estas linhas assisto ao funeral, pela RTP, de José Saramago. Serviço público de televisão, directos sucessivos, depois da missa dominical, também em directo. Amanhã continuam com o futebol. Serviço público esquizofrénico, para não dizer péssimo serviço público.

Não é propriamente o funeral do único prémio Nobel da Literatura atribuído a um português que me leva a escrever estas linhas – nem que viva 200 anos terei outra hipótese de assistir à atribuição de um prémio Nobel da Literatura a um português – mas a ausência do Presidente da República, Cavaco Silva, que resolveu não interromper as suas férias nos Açores para assistir à cerimónia.

Cavaco Silva já disse uma vez, certamente mais que uma vez, que é o presidente de todos os portugueses. Ignóbil mentira. Não é, nunca foi, o meu presidente. Não é presidente de muitos portugueses. Não foi certamente o Presidente da República de José Saramago. E demonstra-o. A sua obrigação, enquanto português, enquanto chefe de Estado, era assistir ao funeral do escritor. Era a sua derradeira hipótese de reparar o erro que o seu Governo cometeu, ao menosprezar, em 1992, a importância do escritor e sua obra. (Houve outros erros, muitos erros; em si, Cavaco, é um erro histórico.)

Mas não. Cavaco Silva não quis estar ao lado de Mário Soares, de Ramalho Eanes, de Eduardo Lourenço, de Pilar e Violante, Guilherme de Oliveira Martins, Jerónimo de Sousa, José Sousa. Não podia, pois claro. Retrógrado, inculto, algo reaccionário, falso moralista, representa o pior do legado salazarista, que continua por aí, transfigurado em democracia. Não digo que seja fascista, ou protofascista, mas é seguramente um produto do salazarismo: tiques de autoritário, disfarçados de boa moral e bons costumes (leia-se catolicismo português, disfarçado de fatalismo dogmático), baseados nos princípios da Constituição de 1933, que estudou na escola e que nunca lhe saíram da memória.

Cavaco Silva, que diz que é preciso exportar a marca Portugal, recusa-se a apoiar o melhor que essa marca oferece. Ao invés, defende um mundo mais fechado, pleno de ordem artificial e imposta, bem ao jeito dos seus mentores, aqueles que governaram o país antes do 25 de Abril de 1974.

O caixão de José Saramago saiu hoje, dos Paços do Concelho de Lisboa, coberto com a bandeira de Portugal. Cavaco Silva prepara, hoje, a sua recandidatura à Presidência da República. Nunca será reeleito.

[canta camarada canta, fernando lopes-graça, gravações inéditas, edições avante!, 2006]

[ACTUALIZAÇÃO: Cavaco Silva explicou por que é que não foi ao funeral de Saramago, depois de o governo ter decretado dois dias de luto nacional. Segundo a RTP, Cavaco disse que "o que um chefe de Estado deve fazer é diferente daquilo que deve ser feito pelos amigos ou deve ser feito pelos conhecidos. Devo dizer que nunca tive o privilégio na minha vida, se me recordo, de alguma vez conhecer ou encontrar José Saramago". Mas disse mais: "todos os portugueses sabem que desde quinta feira à noite estou nos Açores, em S. Miguel, cumprindo uma promessa que fiz há muito tempo a toda a minha família, filhos e netos, de lhes mostrar as belezas desta região". Ora, o chefe de Estado, que diz ser o presidente de todos os portugueses, hoje, foi apenas o presidente da sua família. Tem a certeza da sua razão, sr. Silva? 
Acrescento também que a segunda figura da República, o presidente do Parlamento, açoriano e também de férias nos Açores, não foi ao funeral de José Saramago. 
Aproveito para dizer que um outro ex-Presidente da República, Jorge Sampaio, esteve presente. Um deles, Mário Soares, que também não conhecia o escritor português Prémio Nobel da Literatura, e que o desprezava politicamente, conforme afirmou (o que era recíproco, aliás), esteve presente. Talvez se perceba assim a dimensão de uns e outros. Faço votos, sr. Silva, que os seus netos conheçam estas polémicas. Não os prive de nada sr. Silva, especialmente de conhecimento e sabedoria.] 

[Declaração final: este meu azedume deixa-me mal, sendo ou não justificado (eu acho que é ou não estivesse a perorar sobre a morte de um escritor, que por acaso foi o maior embaixador da Língua Portuguesa desde o final do século XX).  A cultura e a língua são os maiores produtos de exportação que temos, mas isso nunca conseguirá entender Cavaco Silva, que defende isso mesmo, a exportação do que é  nacional. Por isso paro por aqui. Pausa. Não mais voltarei a falar de Cavaco Silva, até ele se tornar uma contradição em si mesmo. Ah! Mas querem saber de onde vem este desprezo todo! Da minha adolescência e pós-adolescência na década do "cavaquismo", em que de repente nos tornámos ricos à custa dos fundos europeus, do dinheiro dos contribuintes da CEE. Foi por aqui que ganhei, às minhas custas, consciência política e de cidadania, que não tinha em casa. Impressionou-me muito perceber que o dinheiro que os ricos da Europa nos enviavam servia para gastar em propriedade pessoal/privada, em bens de ostentação e em negócios e esquemas fraudulentos, muitas vezes apoiados pela classe política e pela administração pública., mas sempre com a finalidade de enriquecimento pessoal e familiar. Impressionou-me muito que o líder de tudo isto (deste não-desenvolvimento) fosse um homem autista, acossado, que se recusava a olhar para o país e a ver o que se fazia com todos esses milhões de contos. Paradoxalmente, era nele que se depositava a confiança.  Ele não teve (nem tem) capacidade de olhar para o país, para as pessoas que o fazem. E isto marcou-me muito. Tive ocasião de comprar os dois volumes autobiográficos de Cavaco Silva, que retratam este período (Foram uma verdadeira pechincha, 6 euros os dois, um deles custou 1,5 euros). Confirmaram apenas o meu sentimento e o erro que foi a sua governação.
Por isso, chega de Sr. Silva. Não voltarei a falar dele, nem bem nem mal. Até um dia...]
que me perdoem os brasileiros e os irmãos africanos por fazer da língua portuguesa um exclusivo português

sexta-feira, 18 de junho de 2010

domingo, 23 de maio de 2010

Fábrica da Areosa

A Fábrica da Areosa era a fábrica de Manuel Pinto de Azevedo. Foi registada em filme, em 1927, e está no YouTube. O empresário aparece na segunda parte do filme (ao minuto 7’45’’). É um documento notável sobre a indústria e os meios de produção do sector têxtil do início do século XX.





Manuel Pinto de Azevedo (1874-1959) era um milionário, um dos homens mais ricos de Portugal. Os seus dados biográficos estão na Wikipedia (que não é uma referência bibliográfica, note-se).

Republicano, conformou-se com o regime fascista de Salazar, que protegeu sempre os grandes empresários nacionais, o que lhe permitiu manter o jornal «O Primeiro de Janeiro», que comprou em 1923. O jornal foi sempre crítico com o novo regime autoritário, especialmente porque mostrava o que se passava no mundo; foi talvez o único jornal nacional a abrir com a secção Internacional. Uma escolha que, já sob a direcção do seu filho, Manuel Pinto de Azevedo Júnior (1905-1978), se revelou fundamental, no período da II Guerra Mundial, para cimentar a sua posição no mercado.

Manuel Pinto de Azevedo Júnior era um diletante, apreciador e coleccionador de arte e cultura, que protegia sempre os seus jornalistas com problemas com a polícia política (a imprensa vivia sob um regime censório desde 1926). Com a sua morte – não teve descendentes – o império Pinto de Azevedo desmoronou-se: os familiares foram alienando as fábricas (entre elas a Efanor, na Senhora da Hora, que é reestruturada pela Sonae de Belmiro de Azevedo), património e participações noutras empresas, afastando-se dos negócios.


A Fábrica da Areosa (Azevedo, Soares e Companhia Lda.) comprou, na década de 1920, a Companhia Fabril e Industrial de Soure, Coimbra, na aldeia de Paleão, implementando modernas técnicas de gestão. A este respeito ver o texto de Jorge Custódio, sobre a máquina a vapor de Soure, que está a enfeitar o interior do Centro Comercial Norteshopping.

O centro comercial, aliás, foi construído em terrenos da Efanor. De notar que o empresário concentrava em si e na mulher a gestão das fábricas, conforme nota o estudo de Maria da Luz Braga Sampaio e Cláudia Monteiro, do Museu da Indústria, naquilo que nomeiam como “Usos de um Sistema de Informação Familiar/Empresarial”.


Importa referir que Manuel Pinto de Azevedo era um homem atento às inovações tecnológicas e compreendia perfeitamente os princípios do taylorismo (produção em massa). Como tinha sido operário, certamente se preocupou com as condições de vida dos seus empregados e da protecção aos meios de produção (menos acidentes e boas condições de trabalho é igual a melhor e mais produção). Daí o patrocínio (não identificado) a um corpo de bombeiros nas imediações da Fábrica da Areosa, que se vê em acção no filme, e a construção de um bairro para os seus funcionários, que ainda hoje existe e pode ser visitado. Trata-se do Bairro da Areosa, com entrada pela Estrada da Circunvalação, junto à Rotunda da A3, por detrás do Instituto Politécnico do Porto.

(Bairro da Areosa, Porto)

A fábrica mais importante de Manuel Pinto de Azevedo era a Fábrica de Tecidos Aliança, no Bonfim, na actual Rua António Carneiro, onde ainda existe, embora abandonada [17/Maio/2011 – Correcção: as instalações da fábrica estão a ser recuperadas e servir de sede a várias empresas.]. A freguesia do Bonfim, tal como Cedofeita, e de alguma forma Campanhã e Paranhos, constituíam a chamada cintura industrial do Porto, na segunda metade do séc. XIX. A população estava concentrada no velho burgo medieval (nas freguesias da Sé, Vitória, Santo Ildefonso e Miragaia), mas assistia à proliferação rápida das «ilhas». As «ilhas» não eram mais que favelas – aglomerados de casas improvisadas, estendidas por um ou mais quarteirões ou becos, ligadas por um emaranhado de estreitas ruas, que normalmente se dirigiam a uma pequena “praça” ou largo interior, onde se situava uma igreja ou associação cultural e recreativa ou de trabalhadores [ou pequeno comércio. Muitos empresários fomentavam o aparecimento de "ilhas" junto das suas fábricas, como forma de garantir mão de obra barata, permanentemente disponível; por exemplo, as mulheres e crianças podiam trabalhar à noite nas linhas de produção, auferindo salários ainda mais baixos que os homens]. O anarco-sindicalismo no Porto provém destes ambientes. As «ilhas» não tinham quaisquer condições de higiene e eram focos permanentes de epidemias, com altos índices de mortalidade [a água canalizada e o saneamento é inexistente nesta época].
(Antiga Fábrica de Tecidos Aliança, na Rua António Carneiro, no Bonfim)

Com a necessidade em erradicar as «ilhas», ainda no século XIX, os proprietários burgueses, que mantinham casas de vários andares e quintal, começaram a «levá-las» para as traseiras das suas habitações, o que lhes garantia um considerável capital em rendas.


A questão era que estas casas, também elas «ilhas», pelas suas péssimas condições de higiene, eram sempre procuradas para habitação, já que a cidade do Porto estava transformada num viveiro, numa colmeia fervilhante, alimentada pelas sucessivas vagas de migrantes do interior rural, que procuravam trabalho nas fábricas têxteis, os maiores empregadores, ou nos mecanismos de emigração que todos os anos lançava mão de obra portuguesa nas Américas, sobretudo Brasil.

Como se vivia (vivem) nas «ilhas» das traseiras das habitações: breve reportagem do Jornal de Notícias, na Ilha de S. Vítor (retirada de TheUrbanEarth.wordpress.com).



[Note-se que as «colmeias» descritas nos parágrafos anteriores são ainda motivo de controvérsia entre historiadores, sobretudo lançam confusão sobre o que entendemos sobre «ilhas». Gaspar Martins Pereira é dos poucos historiadores a descrever as ilhas antes de 1956, as tais «colmeias», já que a ideia que prevalece sobre elas é referente ao estudo «lisboeta» de Manuel C. Teixeira (1996), que as descreve como «tiras» nas traseiras de habitações que, na verdade, foram as únicas que prevaleceram depois do Plano de Melhoramentos 1956-1966. Ver também a este respeito http://meiosdeproducao.blogspot.com/2009/08/panoramas-do-jornalismo-portugues-na.html]. [Em bom rigor, a designação «colmeias» é usada ainda no século XIX para descrever a sobrelotação e azáfama dos "prédios esguios" do Barredo/Ribeira. Em cada andar destes prédios podiam viver várias famílias numerosas.]


A economia exportadora portuense assentava nas indústrias têxtil e conserveira, e na exportação de gado vivo e vinhos. Destino? Inglaterra, pois claro! Sucede que na viragem dos séculos XIX e XX, os ingleses desenvolveram uma importante cadeia de frio, que veio acabar com as importações de gado, e reataram relações com os franceses, voltando a comprar os seus vinhos. As exportações portuenses começaram a cair. Com a implementação do Estado Novo, em 1933, a economia portuguesa sofre transformações definitivas e fecha-se ao mundo (com a natural excepção da economia de guerra, que permitiu vendas de matéria prima aos dois lados da guerra). Salazar privilegiava os grandes lucros dos empresários, que o apoiavam, claro, face aos baixos salários de trabalhadores e operários.


No Porto, as condições de vida dos habitantes, sobretudo e mais uma vez, da classe operária, dos trabalhadores e pequenos comerciantes, só passou a estar no mapa das preocupações do poder político a partir de 1956, com o Plano de Melhoramentos (1956-1966), que veio acabar com as «ilhas» na sua formulação inicial (as «colmeias» instaladas em becos ou quarteirões quase impenetráveis e insalubres). Os funcionários públicos, se não se insurgissem contra o regime (ou fossem suspeitos de se insurgir contra o regime, «ser da situação» ou «ser contra a situação»), auferiam salários bem mais elevados que o proletariado.

Mas, nesta altura, já as indústrias têxteis estavam fora do Porto, instalavam-se no Norte, sobretudo no Vale do Ave, em busca de água (para os processos de tinturaria) e de mão de obra numerosa e ainda mais barata. Sabe-se o que aconteceu a essas indústrias: em decadência desde o início do século XX, tiveram um novo fôlego nos tempos do “Cavaquismo” (década de 1985-1995), com a entrada dos fundos comunitários (que na maior parte dos casos foram desbaratados em consumo pessoal), e acabaram por desaparecer. É verdade que outras houve que foram modernizadas e subsistiram, mas acabaram por se transferir para países onde a mão de obra ainda é mais barata, como alguns países do Leste Europeu, Marrocos, Turquia, Argélia, Índia e China. De qualquer forma, o seu número não é significativo face à quantidade e variedade de fábricas que existiram entre o Porto e o Vale do Ave e Sousa.

(Fábrica de Ribeiro Guimarães & Salazar, Pedome, Famalicão, fundada em 1890; foto retirada de http://ecfamalic.blogspot.com/)

O filme da Fábrica da Areosa foi produzido por «Gloria Film» e foi certamente uma encomenda de Manuel Pinto de Azevedo ou do filho. Deverá ter tido exibição comercial, na série Indústria Portuguesa de Algodão, – o Porto, antes do regime de Salazar, detinha a mais importante indústria cinematográfica do país – mas não está listado no «Prontuário do Cinema Português 1896-1989», de José de Matos-Cruz (Edição da Cinemateca Portuguesa, 1989).


(A exibição de imagens da Fábrica da Areosa, de 1927, deve-se ao ZOrdZ e amigos, dali da zona de Águas Santas.) [17/Maio/2011 – Actualização: As instalações da Fábrica da Areosa ainda existem, ao lado de um dos pólos do Instituto Português de Oncologia]

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Só há uma saída

Na semana da visita do Papa a Portugal foram revelados os indicadores económicos nacionais: crescimento da economia, apesar dos especuladores mundiais continuarem a atacar o país (atacam o Euro, moeda forte, através das economias liberais não produtoras, dependentes das importações, baseadas em modelos de desenvolvimento assentes no sector dos serviços, como a banca, os seguros e o turismo).

No dia 13 de Maio, quase como um milagre, o PS e o PSD anunciam que vão ser impostas mais medidas contra a economia e as famílias portuguesas, como o aumento do IVA em todos os escalões e aumento de impostos em todos os sectores; medidas injustas pois, os que têm mais vão pagar tanto como os que têm menos. Não só injustas, mas imorais porque, ao anunciar o cancelamento de algumas obras públicas (algumas delas ainda bem que param!), o efeito será o empobrecimento rápido de franjas populacionais. Portugal é dos países com os salários mais baixos da Europa apesar do seu custo.












Quanto ganhamos (dir.) e quanto vale o nosso trabalho  (esq.) EUROSTAT

No domingo continuou mais uma audição no Parlamento para saber se o primeiro-ministro e o PS tinham um plano para controlar a comunicação social. Os membros do PCP e PSD nessa comissão terão ouvido escutas ao primeiro-ministro que o poder judicial mandou destruir e que alegadamente confirmam a tese. O comité central do PCP reuniu e avançou com uma moção de censura ao Governo.

Hoje discute-se a moção de censura do PCP, instrumento parlamentar que os jornalistas e a comunicação social não dão atenção, já que o principal partido da oposição, o PSD, revelou a sua intenção em abster-se.

O que fazer com este governo?
Mandá-lo pela janela fora!

Um povo empurrado para uma crise económica por políticos desprezáveis, que no seu percurso partidário revelam falta de carácter e aproveitamento pessoal, só tem que clamar a sua demissão; censurar o PSD pelo medo em ser governo em tempo de crise; e mandar bugiar os que dizem que a demissão destes políticos no poder ainda vai agravar mais a crise.