quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Tudo o que você sempre quis saber sobre a greve... mas nunca teve coragem de perguntar! (ou não lhe souberam explicar) Epílogo

Contar espingardas

A importância do trabalho nas sociedades contemporâneas é primordial. Não nos podemos admirar com o que se pode dizer e se vai dizendo sobre o dia-depois-da-greve-geral-de-24-de-Novembro. Muitos trabalhadores dirão e agora? O que muda? Muita coisa, diria.

O que se nota, em primeiro lugar, é o MEDO dos trabalhadores. Muitos, perfeitamente solidários com a luta das centrais sindicais, foram trabalhar com medo das represálias dos patrões. E é verdade, já chegaram os ecos dessas retaliações, tomadas logo no próprio dia da greve. Outros, também solidários com a luta, meteram um dia de férias, não perderam a remuneração. Outros, ainda, foram trabalhar contra a vontade, sem fazerem greve, pois não se podem dar ao luxo de travar uma batalha desigual com os patrões, estando completamente dependentes das relações precárias que lhes asseguram a sobrevivência.

[Há quem diga que a greve geral de 24 de Novembro foi uma greve da classe média, dos trabalhadores do Estado, daqueles que têm salários mais elevados, mas que vão ser mais diminuídos em 2011. É possível, é que os outros, os que têm salários mais baixos têm relações de trabalho precárias, ao contrário destes.]

É verdade, é um combate desigual. Por mais leis que protejam as relações laborais (e que os países ricos da Europa ainda exigem que Portugal as altere em favor do patronato), a parte mais forte está sempre do lado do patronato. As leis do trabalho existem precisamente para tentar equilibrar uma relação onde existe sempre uma parte mais forte e outra mais fraca.

Isto não quer dizer que esta relação tenha que ser sempre uma luta de classes. Há patrões, muitos e o que se espera é que sejam mais, inteligentes, atentos, que entendem que as suas empresas são competitivas por causa da força de trabalho que empregam. Mas não são a maioria. Como se sabe, aliás, os patrões portugueses são dos mais iletrados da Europa, têm menos habilitações que os seus trabalhadores, e apenas entendem essas relações como uma relação de exploração que lhes permite acumular riqueza pessoal. [Não acredita? Então leia isto ou isto.]

Mas a importância das empresas reside precisamente aí, na criação de riqueza, que deve ser produzida em beneficio da empresa, dos empregados, do patrão, da comunidade em que se insere, na sociedade em geral, no tecido produtivo de um país.

Tudo isto se tem alterado com os actuais governantes da Europa que apenas têm privilegiado a acumulação da riqueza por parte do capital especulativo. Isso é visível na forma como os governos acorreram em massa a salvar os bancos falidos, com dinheiro dos contribuintes. E depois disso, que provocou o descontrolo das contas públicas, ainda vão exigir aos contribuintes que continuem a pagar as operações de socorro ao capital especulativo, à custa dos cortes salariais, aumento de impostos e imposição da “precarização” do trabalho.

Não é necessário recorrer aos exemplos da Irlanda ou da Grécia para perceber isto, temos suficientes exemplos domésticos. O poder político em Portugal que, desde 1974, se resume a três partidos (que podemos considerar de direita), habituou-se a gastar demais; pela acção demonstrada na administração das contas públicas em três décadas, os governos, que gerem as contas públicas, demonstraram ser, no mínimo, maus gestores (também é verdade que herdaram todos os vícios de mais de 40 anos de um regime autoritário, mas isso são outras histórias). Nas últimas décadas aliaram-se ao poder do capital especulativo, protegendo-o a todo o custo, através da baixa taxação, incentivando obras públicas financiadas por esse capital e, agora, como se viu nestes últimos anos, nacionalizando as dívidas dos bancos, injectando dinheiro público em instituições sem qualquer hipótese de recuperação. E agora exigem, claro, que sejam os trabalhadores (a parte mais fraca, lembram-se?) a pagar os desvarios dos seus agentes. Em termos inteligíveis, nada disto faz sentido, a não ser que se tenha institucionalizado o roubo!

 Ainda podem argumentar, Ah mas são os mercados internacionais que estão a fazer chantagem com os países mais fracos… Pois, o fascismo financeiro ou social (leiam bem este conceito proposto por Boaventura Sousa Santos aqui ou ainda aqui)! Isso é uma desculpa de mau pagador. Fiquei muito surpreendido com a argumentação do presidente do Conselho Económico e Social, Silva Peneda, no tal programa televisivo de serviço público que falei aqui. O que ele diz é que há soluções e que elas só não avançam porque a nossa União Europeia está lotada de maus políticos, gente que anda aí a mando do poder especulativo financeiro que, pelo que se vê, tomou conta da Europa.

Pergunte-se então, e agora, o dia depois da greve? Pois bem, medimos forças e preparemo-nos para a próxima, porque só assim nós, que somos a parte mais fraca das relações de trabalho, teremos hipótese de voltar a reequilibrar esta disputa e construirmos uma sociedade mais justa.

É pouco? Não, é muito! Se nada fizéssemos, continuaríamos a perder mais um pouco de nós.

Outras reacções:

Outro registo:
Le Monde via Clube de Jornalistas: http://www.clubedejornalistas.pt/?p=3559

Testemunhos:
Como intimidar trabalhadores precários (com vídeo): 
Forças policiais contra grevistas (com vídeo): 

Recomeça a ofensiva:

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