quarta-feira, 27 de março de 2024

50 anos/50 livros – 25 de Abril 1974/2024 (ii) - Marx & Engels - Marxismo

Karl Marx e Friedrich Engels – Marxismo


O regime fascista português (se não gostarem, leiam autoritário) tem coisas incríveis que não se apercebe quem as viveu, como é difícil de crer para quem as estuda. Autor mais do que proibido, banido, maldito, era Karl Marx. Livros assinados por Marx ou por Marx e Engels eram simplesmente proibidos. Ninguém os podia ler, ninguém os podia ter, ninguém os podia guardar, transportar, oferecer, vender, armazenar… Portanto, a obra magna de Marx, “O Capital”, “Das Kapital”, “Le Capital”, “Capital” simplesmente não podia ser lida. É notável que os políticos e os militares que detinham o poder acreditassem que num país que tinha mais de 25% de analfabetos, em 1970, podia eclodir uma revolução porque os trabalhadores, o povo, tinham lido “O Capital”! Por isso, com o 25 de Abril qualquer chafarica que editasse livros ia logo à procura de títulos marxistas para fazer dinheiro. E faziam-se tiragens impressionantes para os dias de hoje.

 

Uma vez, em 1948, os procuradores da Câmara Corporativa tinham feito um parecer a propósito de uma lei sobre “problemas conexos com a questão da Habitação” e alguém se lembrou que a expressão “mais-valia” estava no articulado. Propuseram de imediato substituí-la por “maior-valia”, considerando que “mais-valia” era um estrangeirismo (!). A discussão alastrou-se depois para a Assembleia Nacional, com alguns deputados a justificar que “maior-valia” não tinha o mesmo rigor matemático que “mais-valia”. Venceu o “estrangeirismo” e ficou “mais-valia” no articulado. Nota-se bem o anti-comunismo do regime salazarista, a subserviência e, sobretudo, a falta de cultura da elite governante.

 


MARX, Karl – O Capital. Lisboa: Edições 70, abril de 1979. 5.ª edição. Coleção Biblioteca 70 – Economia. Tradução coletiva de uma equipa que incluía Joaquim Pinto de Andrade, Ana Maria Barradas, Vera Azancot e Armando Cerqueira. 

 

Esta é uma edição popular que reúne num único volume alguns dos conceitos fundamentais da filosofia económica de Karl Marx, o marxismo. Tradução do francês “Le Capital”, que tem vários volumes. Tem a particularidade, útil, de indicar de onde são retirados os capítulos. Neste caso, são quase todos retirados do Tomo III ["O Capital – O processo global da produção capitalista" (1894, edição póstuma)], mas da versão original alemã, o que é estranho, já que é uma tradução do francês.

 


 MARX-ENGELS – Sobre a Literatura e a Arte. Lisboa: Editorial Estampa, outubro de 1971. Coleção Teoria n.º 7. Tradução de Albano Lima.

 

Este livro reproduz um conjunto de cartas trocadas entre Karl Marx e Friedrich Engels e artigos e conferências de ambos, não propriamente sobre Literatura e Arte, mas abordando a temática a partir da condição económica e social de alguns autores russos, ingleses e franceses. É interessante a crítica que fazem sobre autores precedentes e contemporâneos, críticos do liberalismo, como Saint-Simon, Fourier, Blanc, Proudhon. É uma edição estranha porque o autor estava proibido pelo regime salazarista, mas a obra não consta da lista de livros proibidos. Dessa lista faz parte uma versão em castelhano titulada “Sobre Arte y Literatura”. Quem é que arriscaria, em 1971, editar um livro de um autor banido? Não se trata apenas de pôr em causa atos subversivos, mas de perder dinheiro e arriscar a prisão. Ainda por cima coloca-se o nome do tradutor (que pode ser um pseudónimo). Apesar de a data coincidir com o fim da chamada “primavera marcelista”, pode ter sido editado depois de abril de 1974. Há certamente explicações para isso. [atualização 30/03/2024: na verdade existia um título, Sobre Arte e Literatura, atribuído a Engels e Marx, que foi proibido pela censura. Pode não ser o mesmo livro, mas é sobre a mesma temática.]

 


MARX, Karl – O método da economia política. Venda Nova – Amadora: Manuel Rodrigues Xavier, Livreiros Editores, dezembro de 1974. Coleção 74. Tradução de André Graveto.

 

Este livro é uma curiosidade. É uma edição cuidada, de bolso, sobre um manuscrito inédito de Marx, rascunhos incompletos, compilados e editados, em 1967, por Günther Hillman na Alemanha. Os autores banidos pelo regime fascista eram agora objeto de edições e reedições e todos os queriam ler, provavelmente para ficarem desapontados. Os editores disputavam entre si os direitos para Portugal e editavam tudo. E, certamente, ganhavam dinheiro.

 


 
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich – Crítica da Economia Nacional; Discurso de Eberfeld – Textos inéditos – 1845. Lisboa: Ulmeiro, setembro de 1976. Cadernos Ulmeiro n.º 12. Tradução Manuel Reis Ferreira; Edição e coordenação José Fortunato.

 

Como se disse, editava-se tudo. Os dois textos são uma crítica à obra do economista alemão Friedrich List, “O sistema nacional da economia política” (1841), explica na introdução Jean-Marie Brohm. A coleção Ulmeiro é interessante, não está na esfera do PCP, mas de outros movimentos revolucionários. E também editavam tudo: Che Guevara, Fidel Castro, Rosa do Luxemburgo, Mao Tsé-Tung, J. L. Saldanha Sanches, Ho Chi Minh, Fernando Pereira Marques, Samora Machel, Kim Il Sung, etc.


 

MARX, Karl – Salário, Preço e Lucro. Porto: Livraria Latitude, sem data. Coleção Cadernos Latitude n.º 1. Tradução de J. Carlos Ramires. Capa e Direção Gráfica de Armando Alves. Edição do tradutor.

 

Esta é outra pequena curiosidade. Infelizmente está todo sublinhado a caneta. É possível que tenha sido editado antes de abril de 1974. Era mais um título proibido. É uma edição cuidada. Reproduz uma exposição feita por Marx nos dias 20 e 27 de junho de 1865 nas sessões do Conselho Geral da Associação Internacional dos Trabalhadores, publicado pela primeira vez em folheto, em Londres, em 1898, com o título “Valor, Preço e Lucro”.

 


MARX, Karl – O 18 de Brumário de Louis Bonaparte. Lisboa: Editorial Avante!, setembro de 1982. Coleção Biblioteca do Marxismo-Leninismo n.º 19. Tradução de José Barata-Moura e Eduardo Chitas. Tiragem 3500 exemplares.

 

Trata-se de uma edição a partir do texto do Tomo I das Obras Escolhidas em três tomos, de Marx/Engels, das Edições Avante! Edições Progresso Lisboa-Moscovo, 1982, dirigida por um coletivo composto por José Barata-Moura, Eduardo Chitas, Francisco Melo e Álvaro Pina. Trata-se da interpretação de Marx, à luz da sua teoria filosófica, das revoltas de Paris entre 1848 e 1851. O filósofo procura explicar os acontecimentos através da sua tese onde aborda a luta de classes, revolução proletária, doutrina do Estado e ditadura do proletariado. 

 

MARX-ENGELS – Antologia filosófica. Lisboa: Editorial Estampa, outubro de 1974. 2.ª edição. Tradução de Isabel Vale, Fernando Guerreiro, António Reis e António Melo.

 

Trata-se de uma antologia de textos de Karl Marx e Friedrich Engels produzidos entre 1844 e 1894. Contém excertos de textos que ajudaram a fixar o marxismo como, A Miséria da Filosofia (Marx, 1847), contém o prefácio de Contribuição à Crítica da Economia Política (Marx, 1859), e o texto A Contribuição à Crítica da Economia Política de Karl Marx (Engels, 1859), seguido de extratos de Cartas Filosóficas trocadas entre ambos ou dirigidas a outros autores. São, sobretudo, textos filosóficos, como eram quase todos os textos de Marx e Engels, com destaque para as críticas a Proudhon e Feuerbach. Não é um livro "oportunista", é um livro para conhecedores e estudantes (que ainda não existiam em 1974).

 


ENGELS, Friedrich – A Situação da Classe Trabalhadora em [na] Inglaterra. Lisboa: Editorial Presença, maio de 1975. Colecção Síntese. Tradução de Conceição Jardim e Eduardo Lúcio Nogueira. Capa de F. C.

 

Escrita em 1845, é uma obra fundamental, não apenas no contexto da filosofia marxista, mas como fonte histórica sobre as condições habitacionais das classes trabalhadoras na Inglaterra da Revolução Industrial. É a obra que juntou Engels a Marx, que está na origem do Manifesto do Partido Comunista, publicado em 1848. Engels, nascido na Alemanha (Prússia), era filho de um industrial têxtil, a quem deve o nome, que tinha fábricas na Alemanha e na Inglaterra. Descontente com o filho, que se tinha juntado a grupos hegelianos interessados em combater o capitalismo e a situação política, enviou-o para Manchester. Foi aqui que percebeu empiricamente a situação da classe trabalhadora e se juntou a Mary Burns.

 

 

ENGELS, Frederico [Friedrich] – Anti-Dühring. Lisboa: Edições Afrodite, novembro de 1974. 4.ª edição.  Tradução de Isabel Hub Faria e Teresa Adão da versão espanhola de José Verdes Montenegro y Montoro. Direitos de tradução de Fernando Ribeiro de Mello. Capa: Nuno Amorim.

 

O título original da obra é Herm Eugens Dühring's Umwälzung Der Wissenschaft, que quer dizer "O Senhor Eugen Revoluciona a Ciência". É um título irónico que pretende ridicularizar o filósofo alemão Dühring que havia publicado uma crítica à teoria económica e política de Marx. Editada em 1878, a obra é uma espécie de b-á-bá do marxismo. Dividida em três partes, filosofia, economia política e socialismo, sistematiza a teoria que Marx e Engels vinham discutindo há cerca de 30 anos.



 MARX-ENGELS – A Comuna de 1871. Lisboa: Serviços Sociais dos Trabalhadores da C.G.D. [Caixa Geral de Depósitos], abril de 1976. 1.ª edição. 4000 exemplares. Tradutor Nuno de Brito. Colecção Textos para uma Cultura Popular. "As notas da edição são da responsabilidade de Publicações «Os Hipopótamos»".


Esta edição é outra curiosidade e, diria, rara, apesar dos números da tiragem. É traduzida da versão francesa de Roger Dangeville, com alguns inéditos, dada à estampa pela Secção Cultural dos Serviços Sociais dos Trabalhadores da Caixa Geral Geral de Depósitos. Os Serviços Sociais foram criados na remodelação orgânica do banco público, em 1969; tinham, e têm, personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira, exercendo atividade no domínio da formação cultural, previdência, assistência, habitação e recreio. São detentores de um património valioso. Mas, no tempo do PREC, o que interessava era formar culturalmente e politicamente os trabalhadores, através da edição de literatura marxista. A Comuna de 1871 reúne missivas, discursos e outros textos trocados entre os autores e com outros interlocutores sobre as revoltas de Paris e a aproximação da guerra civil. É uma edição cuidada que revela que os trabalhadores da CGD conheciam e debatiam o ideal marxista.

 

MARX, Karl – A luta de classes em França 1848-1850. Sem indicação de local de edição e editora, impresso em julho de 1971, na Tipografia Camões, na Póvoa de Varzim. Tradução de Isabel Oliveira.

 

Este é mais um livro proibido pelos serviços da censura. Reúne textos de Marx sobre a revolta de 1848, em França, apontando as suas causas, e sobre a forma como acabou. O texto original foi publicado em 1850 e é precedido, nesta edição, por uma introdução de Friedrich Engels, publicada originalmente em folheto em 1895.

Sem comentários: