quarta-feira, 20 de outubro de 2021

Assista à morte lenta de um rio! Jacintos no rio Vouga (parte II)

 

E agora um desafio: o rio Vouga asfixia e morre lentamente à frente dos nossos olhos. O que fazer? 

 

Quem passa na ponte de Cacia (EN 109) – e milhares passam por ela todos os dias! – não pode fingir que não vê nada. E o que vê? Vê que a praga de jacintos-d’água tomou conta do rio. E agora? Vamos deixar que o rio morra? Podemos fazer alguma coisa? 

 

Quando o manto de jacintos-d’água cobre toda a superfície de um rio, como se vê no vídeo, que foi captado em Angeja, junto ao Parque do Areal, as espécies que vivem na água morrem todas porque não conseguem respirar; morrem os peixes que vivem ali; os que vão desovar a montante, não conseguem passar e morrem ali ou desovam onde podem e os seus ovos acabam por asfixiar ou ser comidos por outras espécies a que normalmente estavam imunes; acontece o mesmo com as enguias, com as lampreias; ou com as espécies de flora indígena que ficam sem espaço para se reproduzir, porque toda a superfície do rio está invadida pelos jacintos; ou com as lontras, que deixam de ter alimento e acabam por morrer ou procurar outros cursos de água; ou com muitas aves, que se alimentavam do peixe do rio e agora deixam de ter alimento e têm que procurar outros lugares…

 

Quando dermos conta, já não há nada no rio…

 


O que fazer? Há uma universidade pública em Aveiro [https://www.ua.pt/pt/curso/484] que tem um curso muito afamado dedicado ao Ambiente. Será que eles ensinam os jovens engenheiros do Ambiente a fazer alguma coisa perante atentados ambientais? Ou ensinam apenas que estas pragas de espécies invasoras matam tudo à sua volta? Podiam ensinar a fazer alguma coisa, por exemplo, o que fazer num caso como este, em que vemos um rio a morrer lentamente. 

 

Segundo o Decreto-lei n.º 565/99, de 21 dezembro, que regula a introdução de espécies invasoras, as entidades responsáveis pela fiscalização, instrução de processos e decisão sobre que fazer cabe ao ICNF, Inspecção-Geral do Ambiente, direcções regionais do ambiente, direcções regionais de agricultura, Direcção-Geral das Florestas, Direcção-Geral de Veterinária, Direcção-Geral das Pescas e Aquicultura, Instituto de Investigação das Pescas e do Mar, Guarda Nacional Republicana e demais autoridades policiais (esta lei já deve ter sido atualizada, porque as coimas ainda estão em escudos, mas não sou especialista). Está-se mesmo a ver, não é? Com tantas competências repartidas, quem é que podemos alertar, como se ainda ninguém tivesse visto? Todos?

 


O mais fácil, pelas suas funções, é a GNR e o SEPNA - Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente. Sendo uma força policial, tem um sistema relativamente simples para se apresentar uma queixa. Ok, feito. A queixa foi aceite e aguardamos pelas consequências. 

 

E o ICNF - Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas? Puff! Não tenho o dia todo para procurar uma página online para deixar uma queixa… Descobri, no entanto, que o site do ICNF está em reformulação (há anos?) e convive com dois sistemas distintos, um modernaço que não serve para nada e outro antigo que já não fornece formulários; e então se quisermos fazer uma queixa sobre Ambiente, o ICNF manda-nos para… a GNR!

 


Quanto à Inspeção geral do Ambiente, aparentemente não existe; existe uma coisa chamada de inspeção ambiental pertencente à IGAMAOT, a sigla de Inspeção-geral dos Ministérios do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia e da Agricultura e do Mar, portanto, junta competências de vários ministérios. Deve funcionar muito bem… Bom, mas lá encontrámos um formulário online para deixarmos uma queixa ou uma reclamação: feito, com fotografia, coordenadas e tudo! A IGAMAOT é um órgão com funções de polícia criminal, mas não sei se gostam muito de sair dos gabinetes, porque a maior parte das suas competências é de auto-fiscalização e promoção de estratégias de prevenção e defesa ambiental. E a praga dos Jacintos é um crime sem criminoso! Mas a verdade é que pode atuar junto das autoridades regionais e instá-las a agir, pois isso faz parte das suas competências. Uma das funções da IGAMAOT é “assegurar a gestão e consolidação dos sistemas de análise de risco de cariz ambiental, como ferramenta de planeamento e apoio da sua atividade inspetiva”. Onde estão esses sistemas de análise e por que não são tornados públicos? Estão no site da IGAMAOT? Ah, pois! [Veja se encontra: https://www.igamaot.gov.pt/quem-somos/mensagem-do-inspetor-geral/]


Vejam bem, há poucas soluções neste momento. Aquilo que tem sido feito ao longo dos últimos anos, onde a praga dos jacintos-d’água tem sido cada vez mais visível, é… nada! Sim, nada! A estratégia é esperar que venha muita chuva, esperar que a barragem a montante, de Ribeiradio, em Paradela do Vouga (entregue a privados, claro!), abra as comportas e os jacintos sejam empurrados para o mar. Melhor dizendo, para a Ria de Aveiro, onde a salinidade das águas se encarrega de acabar com a planta. A outra solução é cara e demorada: abrir um concurso público para contratar uma empresa que leve uma barca ou draga para o rio e comece a recolher a planta e depois destruí-la. Até o concurso público estar concluído pode já não haver jacintos à vista… 

 

É verdade que se podia recorrer a meios e fundos próprios, da Administração Pública ou da Administração Regional (CCDRC, por exemplo), fundos de emergência. Mas isso nunca irá acontecer, porque uma situação como esta nunca fará parte das prioridades destas instituições e se investissem dinheiro a fazer essas limpezas para o rio Vouga, tinham também que fazer para o Águeda, para o Mondego, para o Lis, para muitos outros. É claro que quem pensa assim é míope, vê muito mal, pois, se a grande atividade económica que o centro do país tem vindo a promover é o turismo, depois tentem explicar aos turistas que os rios estão mortos porque nada fizemos para os salvar.

 


E agora o que fazer? Uma parte já está: as autoridades públicas têm conhecimento desta situação porque foram avisadas. E depois? Não tenho resposta ou não quero dá-la. Mas suspeito que vamos continuar a assistir à morte lenta do rio Vouga. 

 

Lembram-se que existe uma coisa chamada Região de Aveiro, que andou a distribuir uns cartazes didáticos com os animaizinhos que vivem na Ria e nos rios que ali vão desaguar? Ainda vão mudar os cartazes para: “As espécies que HABITARAM neste ecossistema.”

 

Veja como estava o rio Vouga em 2019 e veja como está agora, em 2021: 

Rio Vouga em Angeja, 2019; foto meiosdeproducao.blogspot.com.

Rio Vouga, em Angeja, 2021; foto meiosdeproducao.blogspot.com

Veja o que se disse em 2019:

https://meiosdeproducao.blogspot.com/2019/11/originario-da-amazonia-e-introduzido-em.html

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