terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

É uma questão de bom senso...

Se formos pessoas de bem…

Se formos pessoas de pensamento racional…

Se pensarmos um bocadinho sobre as coisas…

 

 Alguém pode ficar sério quando houve até à exaustão (nas televisões e nas rádios, e depois nos jornais e depois por todos os cantos da internet) coisas como esta? “Bruxelas pressiona governo a cortar proteção dos contratos sem termo” (via Dinheiro Vivo). Conforme diz a notícia, a Comissão Europeia entende que em Portugal (e também em Espanha) há uma excessiva proteção aos trabalhadores que têm contrato sem termo nas empresas, portanto, aqueles que são considerados efectivos (logo, “menos precários” do que aqueles que têm contrato a prazo). Diz ainda que o maior problema é que “os custos do despedimento individual de trabalhadores permanentes sem justa causa são incertos para os empregadores”.

Sim, leu bem! É esta a proposta ideológica da Comissão Europeia. Pobres dos empregadores, leia-se EMPRESAS/EMPRESÁRIOS, que por causa da rigidez do mercado de trabalho em Portugal e Espanha não podem despedir depressa e bem, porque se os tribunais considerarem que o despedimento foi ilegal esses trabalhadores têm que ser reintegrados.

Esta posição da Comissão Europeia parece inacreditável (na verdade, andam a defender a precarização e desregulamentação do mercado de trabalho na Europa há mais de uma década), além de ser imoral, injusta, contraproducente, geradora de desigualdades e criadora de um lastro social de descontentamento, populismos, extremismos, conducente à destruição da democracia e da liberdade.

 

A posição da Comissão Europeia surge recheada de cinismo, ou não soubessem os “bruxelenses” que nas últimas semanas foram despedidos mais de 600 trabalhadores (a maioria mulheres, portanto, tradicionalmente com os mais baixos salários) de um grupo têxtil de Famalicão. 

 

Não houve problema nenhum em despedir estas centenas de trabalhadores, não houve qualquer impedimento, não houve qualquer constrangimento em terminar com o vínculo laboral destes trabalhadores efectivos. Repare-se no cinismo da situação: as trabalhadoras ainda estão em vigília à porta da empresa para que não sejam retiradas máquinas e património das instalações, sem que os tribunais ou os agentes da justiça se preocupem com a subtração de bens da massa falida (via jornal O Minho e tvi24). Já viram a “lata” da Comissão Europeia a defender os pobres dos empresários?!

Ainda hoje a Comunicação Social internacional refere que o crash da Bolsa de Nova Iorque (cujos índices estavam anormalmente altos desde que Trump assumiu a Presidência dos Estados Unidos, há cerca de um ano) deve-se à previsão do aumento dos salários dos trabalhadores, que deverá fazer aumentar as taxas de juros! Bem, é o que diz o Público: a notícia é esta mas só o último parágrafo é que dá esta explicação e cita a agência Reuters (Pode ver a explicação aqui).

 

Este ataque ao mundo laboral, à organização das sociedades democráticas contemporâneas com o sector social como pilar da organização familiar, não é novo na história, nem nos nossos tempos. Eu continuo a defender a globalização e não vou explicar porquê aqui, mas em vez de os países andarem a discutir o livre comércio mundial, devem – obrigatoriamente – discutir a organização laboral em conjunto com o comércio livre. E se não o quiserem fazer, pretendendo apenas discutir o lucro das empresas geradas por esse comércio livre, então deve abrir-se uma nova mesa de negociações que imponha os direitos laborais a todos os países em negociações.

É uma questão de sobrevivência da espécie, que é cada vez mais urgente. Se continuarmos a cavar um fosso entre os muito ricos e os outros, o resultado inevitável será um de dois: guerra ou escravatura. Não queremos nem um nem outro, pois não?

Imagens: Símbolo  gráfico retirado da OIT; imagem das trabalhadoras da Rincon, não assinada, retirada da Rádio Renascença online; imagem da Bolsa da Nova Iorque retirada da Reuters online, assinada por Brendan Mcdermid.