sábado, 29 de dezembro de 2012

Paulo Rocha (1935-2012)

Paulo Rocha (foto de Fernando Veludo/Público)
Breve obituário do cineasta no jornal Público on line. Colocarei em breve informação sobre o cineasta e sua obra, que tive a sorte de entrevistar. Era um dos meus realizadores preferidos. Não fosse a doença degenerativa que padecia, há longos anos, continuaria a dar novos rumos ao cinema português.

Gosto deste cartaz! Por que será?

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Papiniano Carlos (1918-2012)


Depois de escrever umas linhas sobre Óscar Niemeyer fiz uma passagem por blogs amigos e dou de caras com esta notícia. A notícia da morte de Papiniano Carlos mereceria outro destaque nos órgãos de informação tradicionais. Portugal é um “país de poetas”, não é? Papiniano Carlos é dos poetas contemporâneos mais editados e traduzidos. E, no entanto, pouco se nota. Tive o prazer de o entrevistar em sua casa, em Pedrouços, Maia, em 2004, para o extinto «O Primeiro de Janeiro». Entregou-me uma bibliografia completa da sua obra, até à data, que espero reencontrar e acrescentar a este postal (a que se segue não está completa mas é, de facto, a fundamental). Também me lembro bem do “reaccionarismo simpático” da maioria PSD da Assembleia de Freguesia de Pedrouços que recusou fazer uma homenagem  ao poeta, depois de a aprovar por unanimidade. Notável, até porque os filhos, os netos e os bisnetos dos autarcas da Maia aprenderam o ciclo da água através do poema “Menina Gotinha de Água”. No fundo mostravam os tiques reaccionários que o salazarismo montou ao eleger o comunismo, o socialismo e a democracia como inimigos do regime. Os textos que se seguem foram publicados n'«O Primeiro de Janeiro», no tal suplemento «Concelho Maia», publicado às terças-feiras no concelho. Alguns deles eram repescados para a edição diária. Mais uma vez não consigo precisar as datas de publicação. Mas penso que os primeiros textos, que deram duas páginas, são de Outubro de 2004, o texto seguinte, uma coluna, é do início de Dezembro de 2004 e o último foi escrito a propósito da inauguração da sede da Junta de Pedrouços, a efectiva homenagem, que acabou por ser abafada pela festarola e pela distinção aos "professores do livro único", em Julho de 2005.


Papiniano Carlos vai ser homenageado pela assembleia de freguesia e junta de Pedrouços

Poeta, resistente e interventivo

Papiniano, foto da UP
Papiniano Carlos foi homenageado pela sua editora, a propósito da reedição de “Terra com Sede”. A assembleia de freguesia e a junta de Pedrouços, na Maia, onde reside, estão a preparar uma homenagem pública ao poeta, que completa 86 anos de vida. «O Primeiro de Janeiro» dá-lhe a conhecer um autor que atravessou todo o século XX.

<assin>Paulo Almeida
<assin>Carlos Machado (fotografias)
No início do século XX, Portugal era um país atrasado, onde a maior parte da população era analfabeta. Depois do golpe militar de 28 de Maio de 1926 tudo ficou diferente, embora o atraso permanecesse.
Nas primeiras duas décadas do século, cresceram os movimentos operários, multiplicaram-se as escaramuças entre republicanos e monárquicos, e a Igreja Católica sofreu uma severa perseguição. António Salazar chegou à presidência do Conselho de Ministros no início da década de 30 e instaurou uma polícia política, aprimorando a censura prévia, nascida no golpe militar.
Com Salazar no poder, cresceu também uma corrente literária que ficou associada à resistência à ditadura. O Neo-Realismo surgiu em revistas juvenis, como “Outro Ritmo” (Porto, 1933), “Gleba” (Lisboa, 1934), “Ágora” (Coimbra, 1935), e estendeu-se às revistas literárias de referência nascidas na década anterior, como a “Seara Nova” ou a “Presença”. O Neo-Realismo, que depois se estendeu às artes plásticas e ao cinema, ficou marcado por uma dimensão de intervenção social, desenvolvendo-se com o clima gerado no pós-Guerra Mundial, Guerra Civil Espanhola, e com a perseguição que o regime salazarista fazia aos movimentos socialistas. Foram surgindo nomes na poesia, no romance e no conto como Sidónio Muralha, João José Cochofel, Carlos de Oliveira, Fernando Namora, Manuel da Fonseca, Mário Dionísio, Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol ou José Gomes Ferreira.
Nessa altura, o Porto era uma cidade florescente. A vida social fazia-se nos cafés, os homens andavam de chapéu e circulavam eléctricos por toda a cidade. Mas também se passava fome.

<et>Tertúlia no “Rialto”

O Rialto
pormenor
Foi neste clima que surgiu um jovem poeta com um nome estranho. Associado ao Neo-Realismo, Papiniano Carlos editou pela primeira vez em 1942. Foi o livro de poemas “Esboço”, em edição de autor. Tinha 29 anos e participava em tertúlias com Egito Gonçalves, António Rebordão Navarro, Daniel Filipe (jornalista do "Diário Ilustrado"), e Luís Veiga Leitão. Mas também Germano Silva, na altura jovem jornalista, Jaime Brasil (fundador do suplemento Literário de «O Primeiro de Janeiro», “das Artes das Letras”, em 1942), António Ramos de Almeida (jornalista do “Jornal de Notícias) e, ocasionalmente, José Augusto Seabra. Este grupo parava no desaparecido café “Rialto”, na Praça D. João I. Papiniano recorda que o “Rialto” tinha uns enormes murais de Abel Salazar, que dominavam por completo a sala. Os seus poemas foram surgindo em publicações diversas, talvez a mais importante fosse “Notícias do Bloqueio”, uma série de cadernos editados entre 1957 e 1961.
Embora identificado com uma segunda vaga do Neo-Realismo, Papiniano Carlos ultrapassa este espartilhar. O poeta afirmou a «O Primeiro de Janeiro», que a sua “imagem é o planeta Terra e as forças motrizes que movem a Terra e movem também o homem em ascensão”.
O crítico literário Serafim Ferreira, escreveu no jornal “A Página da Educação”, a propósito de “A menina gotinha de água”, que “o que pesa em toda a obra de Papiniano Carlos é sobretudo o modo interventivo e participativo de se servir da palavra poética como arma ou forma de compromisso sincero e coerente. Ou como observou Jorge de Sena, a sua poesia ‘ergueu-se acima da oratória, com vibrante generosidade e algum desdém pelas artes poéticas, e teve larga influência em poetas ulteriores’”.
“A menina gotinha de água”, poema infantil editado em 1963, é a sua obra mais conhecida, tem vindo a ser reeditada ano após ano, e tem ensinado o ciclo da água a gerações e gerações de crianças.

<et>Prisioneiro político
Lourenço Marques no início do séc. XX
Papiniano Manuel Carlos de Vasconcelos Rodrigues nasceu na antiga cidade de Lourenço Marques, hoje Maputo, em 1918. O seu pai era militar e estava destacado em Moçambique, onde o filho permaneceu até completar o ensino primário. “Vim cedo para cá”, disse-nos o poeta, “mas fiz o exame da quarta classe em Moçambique, os exames eram muito bons lá. Estudei numa escola pública, no meio dos mulatos, dos pretos, lidei com todas estas raças e considerei-os meus irmãos. Mais tarde voltei lá, já homem. Fiz um circuito, passei por Angola, fui a Moçambique, encontrei-me com gente conhecida, alguns deles ainda eram vivos”.
Papiniano veio então para Portugal, para Cinfães, onde residiam os avós maternos. Este contacto com as gentes do campo serviram-lhe de inspiração para as personagens de “Terra com Sede”, livro que a Campo das Letras acaba de reeditar . “Desde a infância lidei muito com o complexo das aldeias, escrevi também muito sobre tudo isso”, esclareceu o poeta.
Liceu Alexandre Herculano, projecto de Marques da Silva
Estudou depois no Liceu Alexandre Herculano, começando a escrever em jornais escolares. Chegou a entrar na universidade, inscrevendo-se mesmo em vários cursos, mas nunca terminou nenhum. “Eu até era bom aluno, tirava boas notas. Naquele tempo, de facto, comecei a ler muita coisa, fora já do liceu, mas eu queria era ir para a tropa, o meu pai tinha sido tropa, mas sabe o que me aconteceu? Fui fazer o exame e fiquei inapto e aquela carreira acabou, não é?”, revelou Papiniano.
O clima de opressão que se vivia no país, com a censura prévia e uma polícia política que tinha ouvidos em todo o lado, foram aproximando Papiniano Carlos do Partido Comunista Português, a única força partidária que se manteve activa desde o golpe de 1926. O poeta refere que o PCP era a estrutura de oposição mais importante, conseguindo atrair os jovens que queriam combater o regime, como ele.
Entre as décadas de 1960 e 1970, Papiniano viajou pelo estrangeiro, representando o partido em diversas encontros, como no Congresso Mundial da Paz, que teve lugar em Moscovo, em 1973. Entrava e saia clandestino do país, o que lhe valeu várias prisões pela PIDE. “Uma vez vieram bater-me à porta aqui em casa [na altura Águas Santas, freguesia da Maia], percebi que era a PIDE e fugi para o quintal do vizinho, eles não me conheciam, mas quando viram que andavam à minha procura, não disseram nada e ajudaram-me a escapar”, contou-nos o escritor. Papiniano teve menos sorte noutras alturas, como quando vinha de Argélia, de um congresso, e acabou encarcerado pela PIDE no Algarve, quando desembarcava numa praia de pescadores.

<et>Azares da vida
A actividade política clandestina permitiu-lhe conhecer algumas das personalidades mundiais da época, como o chileno Nobel da Literatura Pablo Neruda. “Numa ocasião, era ele embaixador do Chile em Paris, combinámos uma entrevista. Quando regressasse de São Paulo, eu passava por Paris para fazer a entrevista durante um almoço… Mas acontece que, entretanto, um tal Pinochet, com a ajuda dos americanos, tomou conta do país, mataram o presidente, e com aquela agitação toda acabei por não fazer a entrevista”, recordou Papiniano Carlos.
Valentina Teráshkova, primeira mulher no espaço
O escritor, aliás, não tinha qualquer inibição em conhecer aqueles que se iam tornando vultos mundiais, em qualquer sector. “Conheci também a astronauta soviética Valentina Teráshkova [a primeira mulher a subir ao espaço, em 1963], foi na Bélgica, fui logo ter com ela, eu sou um gajo muito rápido a dirigir-me às pessoas, falo logo com elas, muito prazer, etc, etc”, confessa Papiniano.
O autor de “Caminhemos serenos” contou-nos como é que magoou os dedos da mão esquerda, quando se preparava para seguir viagem, na estação de Campanhã, mas “o outro azar que tive durante a vida” surgiu com a morte de Henrique Perdigão, o fundador da Livraria Latina, no Porto. Papiniano participou num concurso de contos, “passei o que tinha à máquina, fiz várias cópias daquilo e mandei o livrinho, com um pseudónimo. Não ganhei, mas recebi um menção honrosa, a minha mulher disse-me para eu ir lá receber o prémio, e quando o Henrique Perdigão soube que era eu chamou-me e disse que o meu livro tinha sido o melhor que apareceu no concurso e que o ia editar e ia editar os meus livros todos, mas depois ele morreu de repente e acabei por não publicar nada”.

<et>Os nomes do antigamente
O dia-a-dia de Papiniano não é hoje tão aventuroso. Vive numa vivenda em Pedrouços, a única freguesia da Maia que faz fronteira com o concelho do Porto e que pertenceu a Águas Santas até 1985.
Portugal 7- Russia 1
O poeta conta-nos que vários nomes de ruas da sua freguesia foram escolhidos por si, “foi a seguir ao 25 de Abril, comecei logo pela Rua do General Humberto Delgado, depois Rua Abel Salazar, todos aqueles nomes históricos do antigamente”. Escolheu os nomes dos vultos que combateram a ditadura, muitos deles vítimas do regime fascista.
Recebeu em sua casa muitos destes resistentes e colegas de tertúlia. Além de fotografias, livros e revistas da época, Papiniano mostrou-nos uma parede escrita a lápis, que reservou para as mensagens dos seus amigos. Entre outros, lá está uma dedicatória de Álvaro Cunhal.
Hoje os seus interesses são outros, “estou mais preocupado com a nossa selecção, no último jogo com o Lichtenstein empatámos, mas estivemos quase a perder, de maneira que amanhã, vamos ver… [o encontro com Papiniano Carlos foi na véspera do jogo da Selecção Nacional com a Rússia, que Portugal venceu por 7-1]. Eles eram amadores, mas corriam mais que os nossos, mas o Scolari também fez umas substituições… Mas eu sou um treinador de bancada…”.

COLUNA

Bibliografia de Papiniano

(Primeiras edições)

“Esboço” – Poemas, edição do autor, 1942, Porto;
“Ó Lutador” – Poema, edição do autor, 1944, Porto;
“Estrada Nova” – Poemas, edição do autor, 1946, Porto;
“Terra com sede” – Contos, Portugália Editora, Colecção Gente Nova, 1946, Porto;
“Poema da Fraternidade” – Poema, edição do autor, proibida e apreendida pela PIDE, 1946, Porto;
“Mãe Terra” – Poemas, edição do autor, 1949, Porto;
“A Floresta e os Ventos” – Contos e poemas, edição do autor, proibida e apreendida pela PIDE, 1946, Porto;
“Caminhemos Serenos” – Poemas, Textos Vértice, 1957, Coimbra;
“Uma estrela viaja na cidade” – Poema dramático, edição da revista Bandarra, 1958;
“A Rosa Nocturna” – Crónicas, Edições Sagitário, 1961, Lisboa;
“A menina gotinha de água” – Poema para crianças, Portugália Editora, 1963, Lisboa;
“A Ave sobre a cidade” – Edições Paisagem, Colecção Arte e Poética, 1973, Porto;
“Sonhar a terra livre e insubmissa” – Poemas de Egito Gonçalves, Luís Veiga Leitão e Papiniano Carlos, Editorial Inova, Colecção Duas Horas de Leitura, 1973, Porto;
“O Rio na Treva” – Editorial Inova, Colecção Metamorfoses, 1975, Porto;
“Luisinho e as andorinhas” – Ab Livro, Edições Infantis e Juvenis, 1977, Porto;
“O Cavalo das Sete Cores e O Navio” – Textos para infância e adolescência, Editorial Opinião, 1980, Porto;
“O grande lagarto da pedra azul” – Textos para infância e adolescência, Editorial Caminho, 1986;
“A Viagem de Alexandra” – Textos para infância e adolescência, Porto Editora, 1989, Porto;
“A Torrente” – Casa Museu Abel Salazar, 1989, São Mamede de Infesta;
“A Palavra Revelada” – Colecção Almeida Cousin, Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, 1997, Vitória, Brasil;
“A memória com passaporte” – Campo das Letras, Colecção Campo da Memória, 1998, Porto;

O poema infantil “A menina gotinha de água” tem sido reeditado todos os anos, em edições ilustradas e musicadas. O autor encontra-se representado em diversas antologias poéticas, desde a década de 1960; o poema “Canção de Catarina” foi musicado por Fernando Lopes Graça, em “Canções Heróicas II”, em 1973; “A menina gotinha de água” serviu de texto para um filme com o mesmo nome, realizado por Alfredo Tropa, para a RTP.

CAIXA

<t7>Intenções e homenagens
Papiniano Carlos foi homenageado pela sua editora, a Campo das Letras, no último sábado, no Ateneu Comercial do Porto. A editora não precisava de um pretexto, mas a reedição, este ano, de “Terra com Sede”, serviu para juntar amigos e colegas de escrita em volta de um escritor que deixou marcas no século XX. Fonte da Campo das Letras disse ao «PJ» que o editor Jorge Araújo “conhece-o desde a mais tenra idade, foram companheiros, mesmo de partido político, durante muitos anos. O Papiniano foi um poeta muito importante, toda esta geração foi um grupo com muita força”. A mesma fonte refere que, “em termos editoriais ‘A menina gotinha de água’ é o maior sucesso de Papiniano, praticamente todos os anos reeditamos o livro. É extraordinário, quem leu o livro percebe o seu sucesso”. O poeta deverá ser homenageado publicamente até ao fim do ano pela assembleia de freguesia e junta de Pedrouços, na Maia onde reside. Esta decisão foi aprovada por unanimidade no último plenário, em Setembro. Porém, o «PJ» não conseguiu saber se essa cerimónia já está em preparação, nem qual a data em que se realizará.

Com a mulher, foto da Global Imagens
<t7>Papiniano Carlos com homenagem polémica
A homenagem a Papiniano Carlos está a causar polémica entre a Assembleia de Freguesia de Pedrouços e o executivo liderado por Abílio Sousa. Acordada na última assembleia ordinária, entre assembleia e executivo, a cerimónia de homenagem ao poeta deveria realizar-se até ao fim deste ano, mas como os prazos se foram esgotando, ela foi sendo adiada. Agora, uma comissão da assembleia propõe a cerimónia para Janeiro ou Fevereiro, enquanto o executivo aponta para o dia 9 de Julho, altura em que será inaugurado o edifício da nova junta, quando se comemora também o vigésimo aniversário da freguesia de Pedrouços.
O presidente da Assembleia, Jorge Figueiredo, referiu ter tido uma reunião com alguns membros desse órgão, que apontam a homenagem ao poeta para uma data entre 15 de Janeiro e 12 de Fevereiro. Contudo, disse não ter ainda contactado o executivo. Mesmo assim, Jorge Figueiredo afirma que o dia 9 de Julho “é uma data histórica” e é uma possibilidade para a data da homenagem.
Por outro lado, o presidente da junta, Abílio Sousa, diz que tudo deve ser feito “com cabeça, tronco e membros, ora, apenas e só por que foi deliberado, temos que fazer? Não. Também não foi deliberado que [a homenagem] era especificamente para [o Papiniano Carlos]. Também não foi deliberado nenhuma data, disse e continuo a assumir, e sei que o meu executivo está todo comigo, portanto, nada impede que a Assembleia de Freguesia promova uma homenagem, tudo bem, não tenho nada a ver com isso, eu não vou, os meus colegas de executivo se querem ir à homenagem, são livres de o fazer”.
A homenagem a Papiniano Carlos, residente em Pedrouços, foi proposta pelo eleito do PCP, Etelvino Reis, na última assembleia ordinária da freguesia, e foi aprovada por unanimidade. Na mesma altura, o executivo também se associou à intenção, mas não ficou acordada nenhuma data.
<assin>P.A.


COLUNA
<t7>Papiniano Carlos homenageado
Papiniano Carlos, juntamente com outras personalidades da freguesia de Pedrouços, foi homenageado ontem à tarde pela junta por “se destacaram no desenvolvimento da freguesia, nas áreas da educação, da literatura, da medicina, do teatro, entre outras”.
Papiniano Carlos
A “cerimónia singela”, nas palavras de Abílio Sousa, decorreu no novo auditório da junta, de forma rápida e sem grandes discursos.
O poeta Papiniano Carlos, de 86 anos, reside em Pedrouços há várias décadas e foi um resistente ao período fascista, tendo sido preso várias vezes pela polícia política. Com a sua habitual timidez, não subiu ao palco, como os restantes homenageados, mas pediu para ler um dos seus poemas. Escolheu ler “A ave sobre a cidade”, o poema que dá o nome à obra que editou em 1973.
Papiniano Carlos deveria ter sido homenageado pela junta e pela assembleia de freguesia no ano passado, mas Abílio Sousa recusou-se a fazer uma cerimónia apenas para o poeta. Foi protelando a homenagem e resolveu juntar outros nomes que “se destacaram no desenvolvimento da freguesia” num evento preparado para coincidir com a inauguração da junta e aniversário da elevação a freguesia. Papiniano Carlos, autor de um dos poemas mais vezes editado em Portugal, “A menina gotinha de água”, foi homenageado este ano em Vila do Conde e em Gondomar. Bragança Fernandes participou na cerimónia e desejou a todos os homenageados, “na pessoa de Papiniano Carlos”, muito amor e saúde.
Entre as personalidades distinguidas, algumas já falecidas, contam-se o pároco local Guedes Pinto, o pintor António Fernandes, o cenógrafo Mário Mendes, o fadista Augusto Silva, o pintor Abbot Costa, dois médicos, dois enfermeiros e onze professores reformados.

De onde vieram as fotos:

Papiniano: 



O Café Rialto:
Lourenço Marques:
A austronauta: 

O futebol: 

Óscar Niemeyer (1907-2012)




O meu contacto directo com a obra de Óscar Niemeyer foi no Funchal, primeiro em 2002, depois em 2008. O Hotel Casino do Funchal (1966) é uma obra notável, com uma volumetria impressionante, mas perfeitamente integrado na paisagem, ou melhor, redefinidora da paisagem. O hotel fica entre a Avenida do Infante e o porto marítimo; a avenida é a montra das elites do Estado Novo, as poderosas famílias conservadoras da Madeira e/ou Lisboa construiram ali as suas vivendas, num estilo arquitectónico ao gosto regime, um misto de conservadorismo com traços de um modernismo desactualizado. Hoje, como seria de esperar, as vivendas estão quase todas ocupadas por bancos ou empresas de serviços (o velho neo-liberalismo capitalista a funcionar! Ou a ganância! Ou o "off shore" da Madeira!). A obra de Niemeyer rasgou o horizonte sobre o mar, impondo uma vista obrigatória, a partir das vivendas das elites. Um feito notável, também da família que o apoiou, ao chamar um comunista para redesenhar a paisagem da avenida das elites. [A estátua de Sissi é um pólo de atracção acessório, destinado aos turistas do centro da Europa; todos os dias, alguém (o hotel?) deposita flores frescas na estátua da imperatriz, alimentando uma ideia etérea do imperialismo cor-de-rosa desenhado pelo star system de Hollywood.]
Em 2002, estava no Funchal para a inauguração do terminal de passageiros do Aeroporto Internacional da Madeira (penso que foi a primeira vez que ali aterrou um Boing 747) e o Governo Regional convidou os jornalistas a jantar no Casino. Confesso que não prestei grande atenção à arquitectura, mas ficou a ideia de uma certa decadência por causa do mobiliário gasto, da comida pouco recomendável e das coristas estrangeiras. Em 2008, procurei observar e fotografar o imóvel (com telemóvel), mas escaparam muitos pormenores. Espero voltar. Aparentemente é a única obra de Óscar Niemeyer em Portugal. É pouco, está longe, e reproduz um tempo sócio-político em Portugal. Niemeyer e o seu hotel-casino são um marco indiscutível do autoritarismo português. Da resistência "integrada" ao/no autoritarismo português.

[Act. Jul. 2013: afinal parece que Oscar Niemeyer renegou esta sua obra, atribuindo-a a Viana de Lima. Azar o meu que assim estragou este postal, desmentindo-o até. Curioso também que a impressionante volumetria do edifício não era do agrado do autor brasileiro, por mexer numa paisagem que no seu entender deveria ser protegida. A (breve) explicação sobre a autoria do Casino Hotel da Madeira pode ser encontrada aqui: